quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Os retirantes 1944 – Cândido Portinari

Portinari quer mostrar em sua tela uma realidade social ,que a maioria parece não querer ver, com uma intenção clara de denúncia social, problemas de miséria, ignorância, opressão nas relações de trabalho e apresentando a força da natureza sobre um homem completamente desprotegido.
A natureza aparece como elemento fundamental na tela, um ambiente semiárido semelhante a uma paisagem desértica, cheia de pedras e restos de ossos, que parece conspirar contra a família de migrantes, expulsando-a não se sabe bem para onde. A monotonia marca o tom do ambiente, não há florestas nem montanhas para distrair a visão e atenuar a secura. Quase sempre sinistra e desolada, a paisagem permite que se veja longe e fundo, tornando ainda mais ostensivo o drama dos retirantes.
O velho e a criança parecem caveiras, tal é o estado de debilidade física, bem como a outra criança que está no colo da menina à frente do avô, pois se acredita que a família do quadro é composta por pai, mãe, cinco filhos e o patriarca representado pelo velho.
Tudo o que possuem cabe em duas trouxas, uma pequena e uma média, respectivamente no ombro do pai e na cabeça da mãe, demonstrando claramente que todos seus pertences estão contidos nesses dois sacos. A condição da família, é de miseráveis e famintos que migram por causa da natureza que os castiga e expulsa.
O céu está limpo,com um sol escaldante que contrasta ao fundo com os urubus , sobrevôo furioso à espreita do sinal de que a vida não mais habita o corpo; o cajado nas mãos do avô parece unir-se ao urubu, numa clara alusão à foice, símbolo do medo pela proximidade da morte.
Todos têm a fisionomia da desesperança e do tédio, parecem abandonados à própria sorte, caminham para algum ou nenhum lugar, trazem consigo a marca da tristeza e da falta de perspectiva de uma vida menos árida. Determinador de destinos, a paisagem impõe uma marcha inútil, pois o caminho que procuram se fecha em si mesmo, não leva a parte alguma.
A criança no colo da menina mostra as costelas da fome, ossos à mostra nas pernas tortas da garota e barriga protuberante, indicadora de vermes, no menino ao lado do pai. A família está descalça, pés grandes, castigados pelo contato com a terra seca e cheia de pedras.
Ao dividir o quadro em quatro partes, o que podemos vislumbrar bem no centro é um novo ser na barriga da mãe, luminoso e querendo logo vir ao mundo, inocente do que irá encontrar.O que podemos inferir quanto à periodicidade do problema que se abate sobre eles, ou seja, que a seca e a miséria são uma constante na vida do povo nordestino, está nessa família de gerações consecutivas, avô, pai e filhos.
A obra parece o tempo todo nos impor uma leitura quase natural, de que o homem nordestino é devorado pelos problemas que o meio lhe impõe, não encontra saída e fica como Sísifo, tentando achar a saída, andando em círculos diante de um problema que não tem solução.
Yvanize
yvanize@doispensamentos.com.br

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