domingo, 12 de outubro de 2014

Eleições 2014 e as mentiras contadas no "otário", digo, horário eleitoral...,

‘O vício de sempre’, de Roberto Pompeu de Toledo

Publicado na edição impressa de VEJA
ROBERTO POMPEU DE TOLEDO
No balanço da campanha eleitoral, versão primeiro turno, ressalta o vício habitual: a esmagadora predominância da propaganda sobre a informação. Algumas sugestões para contra-atacar a tendência:
1. Obrigar que parte da propaganda na TV seja ao vivo. O público teria diante de si algo mais próximo da vida real, seja na pessoa do próprio candidato, seja na de seus correligionários, para contrabalançar a fantasia mistificadora dos filmes produzidos pelos marqueteiros. A proposta não é nova. Recentemente foi defendida em artigo na Folha de S.Paulo pelo jurista Ives Gandra Martins (edição de 2/9/2014). Ives Gandra propõe que todo o horário seja ao vivo. Este colunista se contentaria com, digamos, a metade. À vantagem de maior acesso ao candidato em carne e osso, acrescenta-se a do barateamento das escandalosamente caras campanhas brasileiras.
2. Redistribuir o tempo entre os candidatos. “Não há justificativa para que o tempo dos três principais candidatos à Presidência da República nesta eleição seja tão diferente”, escreveu o cientista político Jairo Nicolau, também na Folha de S.Paulo (13/9/2014). Num quadro em que despontam em acirrada disputa duas candidatas, uma tem tempo cinco vezes e meia maior do que a outra. Jairo Nicolau avança proposta que imporia um teto de oito minutos ao tempo do partido ou coligação com mais votos na eleição anterior. Outras faixas de tempo seriam de cinco minutos, dois minutos e um minuto. Além de evitar o exagerado acúmulo de tempo por um ou alguns dos candidatos, a medida estabeleceria um limite às estapafúrdias e suspeitas barganhas por tempo na TV entre os partidos antes de cada campanha. No mesmo artigo, Nicolau observa que, entre 35 países por ele pesquisados, o Brasil é o que mais concede acesso dos candidatos ao rádio e à televisão – duas horas e dez minutos por dia.
3. Enxugar os debates na TV. A sucessão deles, por diferentes emissoras, tem como resultado banalizá-los. Debates deveriam ser – e são, em outras paragens – o grande e mais aguardado momento da campanha. Nos Estados Unidos, não é das emissoras a iniciativa dos debates presidenciais na TV. É de uma entidade independente, a Comission on Presidential Debates; transmite-os quem quiser. Foge-se assim da lógica da concorrência entre as emissoras. Restringi-los a um debate no início e outro no fim da campanha, ou mesmo a um apenas, no fim, ajudaria a restituir-lhes a preeminência.
4. Aos nanicos, segundo sua naniquice. A presença de candidatos com baixa ou nenhuma representatividade, e pífio desempenho nas pesquisas, é outro motivo de desprestígio dos debates do primeiro turno. A legislação em vigor, de 1997, estabelece que têm direito a participar dos debates os candidatos de partidos com representação na Câmara dos Deputados. Já foi pior: antes tinham o mesmo direito todos os candidatos, independentemente da representação na Câmara. Ainda assim os nanicos congestionam e atrapalham. Uma saída seria os promotores dos debates dividirem os candidatos em grupos, que se reuniriam em dias ou horários diferentes. Nada obsta que assim seja, segundo esclarecimento recente do Tribunal Superior Eleitoral. No panorama atual, divididos os candidatos entre os três primeiros nas pesquisas, para um debate, e os demais para outro, o mico de ter de bancar um debate só entre nanicos seria compensado pelo maior interesse em torno do debate que realmente importa.
5. Afinar as entrevistas. Candidatos à Presidência são pessoas hipertreinadas na arte da embromação. Para enfrentá-los, duas regras de ouro são: (1) não se alongar em premissas, antes das perguntas; e (2) não formular mais de uma pergunta de uma só vez. Premissas e mais de uma pergunta fazem as delícias dos embromadores; dão-lhes a chance de ou se agarrar às premissas ou escolher a pergunta mais fácil e caprichar nela até sufocar a outra, ou as outras. Brasileiros, cordiais como são, acham que fazer perguntas diretas e cortantes é falta de educação. Idem contestar as respostas do entrevistado. Procedem segundo tal modelo, com raras exceções (como William Bonner e Miriam Leitão, da Rede Globo), os entrevistadores brasileiros. Caso nem as perguntas cortantes nem as contestações resolvam, o remédio seria apelar para a buzina do Chacrinha. Um toque significaria “está embromando”; dois, “continua a embromação”; três, “acabou o tempo e não respondeu”.

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