terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Os idiotas estão por toda parte...,


Nelson Rodrigues acordou especialmente inspirado em 20 de maio de 1969. “Nada mais XIX que o século XX”, descobriu já na primeira linha da coluna que O Globo publicaria no dia seguinte. Abstraídas “a praia e as medidas masculinas dos quadris femininos”, não havia nada que permitisse distinguir uma época de outra. As semelhanças escancaradas começavam pela consolidação do fenômeno que, segundo o cronista genial, configurou a marca mais notável do século XIX: “a ascensão espantosa e fulminante do idiota”.

Até então, uma nulidade do gênero se limitava a babar na gravata. “O idiota era apenas o idiota e como tal se comportava”, explicou Nelson Rodrigues. “O primeiro a saber-se idiota era o próprio idiota. Julgando-se um inepto nato e hereditário, jamais se atreveu a mover uma palha, ou tirar uma cadeira do lugar. Nunca um idiota tentou questionar os valores da vida”. Como ocorrera desde o começo dos tempos, decidiam pelos idiotas os que tinham cabeça para pensar e sabiam o que faziam. Os rumos eram ditados pelos melhores e mais brilhantes.
As coisas mudaram dramaticamente quando a tribo dos cretinos fundamentais  se descobriu majoritária. “Houve, por toda parte, a explosão de idiotas”, avisou a crônica que, escrita há quase 42 anos, parece descrever o Brasil deste começo de milênio. Nos trêfegos trópicos, a praga que afligiu o século XIX e consolidou-se no século XX assumiu dimensões siderais. Em suas infinitas versões ─ o espertalhão, o otário, o vigarista, o fanático, o farsante, o bobo alegre, o cafajeste, o prepotente, o gatuno ─, os idiotas elegem e são eleitos, escolhem e são escolhidos, nomeiam e são nomeados. Estão por toda parte.
No nono ano da Era da Mediocridade, a espécie em acelerada expansão é representada no governo e na oposição, no Ministério e no segundo escalão, no Congresso, nos tribunais e na imprensa, na plateia que assiste à passagem do cortejo ou nos andores da procissão de espantos que começou há oito anos, não foi interrompida sequer pelas festas de fim de ano e seguiu seu curso no primeiro mês do governo de Dilma Rousseff. O imenso viveiro de cérebros baldios não se assusta com nada.
De partida, Lula foi premiado com caminhões de presentes, passaportes diplomáticos expedidos ilegalmente para alegrar a filharada e um salvo-conduto para bronzear-se no forte do Exército reduzido a pensão de governantes ociosos. De chegada, Dilma montou o ministério mais bisonho de todos os tempos, escalou para gerenciá-lo um estuprador de contas bancárias e recolheu-se ao silêncio de quem não tem nada de proveitoso a dizer nem dispõe de alguma ideia para trocar. Só recuperou a voz depois de surpreendida por uma tragédia anunciada.
Ao fim do passeio pela Região Serrana do Rio, Dilma prometeu fazer amanhã o que Lula jurou ter feito em 2005, solidarizou-se com as famílias assassinadas pela incompetência dos governos federal, estadual e municipal e elogiou o comparsa Sérgio Cabral. O governador devolveu o elogio, agradeceu a Lula por oito anos de providências imaginárias e debitou o massacre premeditado na conta dos antrecessores, de São Pedro, do imponderável e dos mortos.
Nesta quinta-feira, em depoimento no Congresso, Luiz Antonio Barreto de Castro, demissionário do cargo de secretário de Políticas e Programas do Ministério de Ciência e Tecnologia, implodiu com seis palavras a conversa fiada sobre a catástrofe que até então contabilizava 762 mortos e 400 desaparecidos. Depois de revelar que não conseguiu incluir no PAC a implantação de um sistema de alerta com radares, orçado em R$ 115 milhões, que ajudaria a prever desastres em áreas de risco, Barreto resumiu o espetáculo do cinismo homicida: “Falamos muito e não fizemos nada”. Embora saiba disso há oito anos, a oposição oficial nada fala e nada faz.  A idiotia é suprapartidária.
Mas também há mais de 40 milhões de brasileiros que enxergam as coisas como as coisas são e contam o caso como o caso foi. Não é pouca gente. E a munição é farta, como mostrarão os posts que pretendem retratar em preto e branco o verão brasileiro de 2011.
*A. Nunes

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