domingo, 19 de abril de 2009

Suicídio em câmera lenta



Suicídio em câmera lenta


Poucos temas desfrutam de impopularidade similar ao da reforma da previdência. Sempre que o assunto surge em alguma discussão, aparece logo quem diga que qualquer mudança significaria retirar os direitos dos trabalhadores e dos aposentados. Bobagem. A previdência brasileira é injusta, privilegia poucos hoje em detrimento do bem-estar futuro de muitos e tem um custo desproporcional às possibilidades do país.
De cada 100 reais produzidos anualmente pela economia brasileira, 12 são consumidos com aposentadorias e pensões. É um gasto excessivo, sobretudo porque o Brasil é um país jovem e com expectativa de vida baixa em relação às nações desenvolvidas. No Japão, o gasto com a previdência social não passa de 8% do PIB, e nos Estados Unidos ele equivale a 7%. Traduzindo esses dados para valores monetários, o Brasil despende, anualmente, algo como 360 bilhões de reais para bancar as aposentadorias e pensões do setor privado e também dos servidores públicos.
Além de ser um gasto enorme, só comparável, em termos relativos ao tamanho da economia, ao de países europeus, o sistema previdenciário brasileiro é extremamente deficitário, isto é, as receitas obtidas com as contribuições são insuficientes. O rombo atual é da ordem de 100 bilhões de reais. Ao ano. Daria para fazer muita coisa com esse dinheirão todo. Um exemplo. O custo do trecho sul do Rodoanel metropolitano de São Paulo, a maior obra viária em execução neste momento do país, é de estimados 5 bilhões de reais. Isso significa que seria possível construir vinte obras similares apenas, com os recursos de apenas um ano desse déficit.
Na avaliação do economista Fabio Giambiagi, um dos maiores especialistas em finanças públicas do país, o crescente aumento dos gastos previdenciários é uma das causas que explicam o modesto crescimento econômico brasileiro na última década. Em primeiro lugar, porque recursos que poderiam ser investidos na infraestrutura (construindo estradas, portos e ferrovias) são drenados pelo ralo da previdência. O alto custo das aposentadorias também faz com que o brasileiro pague impostos demais, inibindo o consumo e os investimentos privados.
São razões como essa que fazem a reforma da previdência essencial. Mas por que ela nunca sai do papel? Com a palavra Giambiagi, que deu entrevista a Veja sobre o tema, em outubro de 2006: “A questão tem sido maltratada no ambiente político porque há muitos anos deixamos de fazer política de verdade. Esse assunto não pode e não deve ser abordado como tema partidário ou ideológico, mas com números. Precisamos explicar para a população que, sem uma mudança de regras, será muito difícil, para não dizer impossível, ter daqui a vinte ou trinta anos o Brasil que todos almejamos. O Brasil está se suicidando lentamente”.
Giambiagi, a propósito, é o autor de um ótimo livro sobre o assunto, Reforma da Previdência – O Encontro Marcado (Campus/Elsevier; 256 páginas). Nele, o economista indica saídas para que o país escape dessa armadilha. O brasileiro, em essência, terá que trabalhar mais tempo e contribuir mais, antes de se aposentar. Esse ajuste é inevitável, e quanto antes for feito mais depressa o país escapar desse suicídio em câmera lenta.

Por Giuliano Guandalini -

Um comentário:

  1. O brasileiro, em essência, já trabalha demais. Considerando que a grande maioria da população começa a trabalhar com carteira assinada aos 18, mas já deve estar na labuta há mais tempo, é um longo período de trabalho. Mas a previdência aposenta donas de casa aos 65, sem que elas tenham contribuido diretamente. Aposenta trabalhadores rurais, mesmo que sejam sem terra (ou seja, sem trabalho, sem contribuição). Dá "assistência médica" para todos os brasileiros, mesmo os que não contribuem para isso.

    Bom que existam estas políticas, mas o dinheiro para atender este tipo de necessidade, tinha que vir de outra fonte e não da contribuição dos que trabalham. É jogar o custo sobre os ombros da população trabalhadora. Isso, sem contar que aquele que contribui com o teto, compulsoriamente, se aposentará com uns 70% e, ao longo de quatro ou cinco anos, estará recebendo abaixo de 50% do tal teto.

    O setor público é diferente. O aposentado fica com sua pensão igual ao salário da categoria, quando se aposentou. Agora, imaginem um trabalhador do setor privado, perder seu emprego aos 45 anos. Será praticamente impossível conseguir uma recolocação...

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