quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Família Schurmann - Expedição Oriente

UMA PAUSA EM ASSUNTOS ÁRIDOS: A Expedição Oriente, terceira volta ao mundo da família Schurmann em veleiro, partiu neste domingo de Itajaí (SC); a volta, só daqui a mais de dois anos

O veleiro Kat, ancorado em Itajaí, será o lar da família Schurmann pelos próximos dois anos (Foto: Tamara Fisch)
O veleiro “Kat”, ancorado em Itajaí (SC), será o lar da família Schurmann pelos próximos dois anos
Por Tamara Fisch
Em 1984, Vilfredo e Heloísa Schurmann decidiram abandonar a vida em terra firme e fazer do mar sua nova casa. Ele trabalhava como consultor financeiro para grandes empresas, e ela era professora de inglês. O casal partiu para a sua primeira volta ao mundo, numa expedição que durou dez anos, com seus três filhos, Pierre, então com 15 anos, David, de 10, e Wilhelm, de 7. Os Schurmann tornaram-se então a primeira família brasileira a dar a volta ao mundo a bordo de um veleiro.
Para ajudar a financiar a viagem, a família costumava oferecer passeios turísticos pelos lugares por onde passava.
Foi algo surpreendente para o Brasil. O casal criou seus filhos a bordo doAysso, um veleiro de 55 pés (17 metros), que completou com os Schurmann duas voltas ao mundo. As crianças estudavam por correspondência enquanto percorriam uma rota de 120 mil quilômetros com os pais. Antes do final da expedição, Pierre desembarcou nos Estados Unidos para estudar e formou-se em administração, para depois trabalhar como corretor na empresa de investimentos Smith Barney. Seu irmão, David, ficou na Nova Zelândia para estudar cinema. Apenas Wilhelm passou os dez anos a bordo, e acabou se tornando campeão de windsurfe após a expedição.
Para a segunda volta ao mundo, em 1997, os Schurmann já garantiram fontes de renda mais estáveis. Foram feitos acordos com patrocinadores e criados empreendimentos familiares, como palestras e workshops, além de empresas como a Schurmann Produções Cinematográficas (responsável por projetos como o longa O Mundo em Duas Voltas, que conta a história de uma das expedições da família) e o Instituto Kat Schurmann, que mantém projetos educacionais. O casal também conta com a renda de quatro livros escritos e publicados por Heloísa. O que era apenas aventura profissionalizou-se.
Ao todo, foram quatro expedições completadas pela família. Após a primeira volta ao mundo, foi feita uma reconstituição da rota do navegador português Fernão de Magalhães, viagem que chamaram de Magalhães Global Adventure, na qual navegaram o globo pela segunda vez. Depois disso, quando foram completados 20 anos da partida da primeira expedição, a família decidiu comemorar velejando pela costa brasileira durante oito meses. Por fim, os Schurmann passaram dois anos explorando a costa catarinense em busca de onze submarinos nazistas afundados durante a II Guerra Mundial e nunca encontrados — até que descobriram o U-513, conhecido como Lobo Solitário, a única das embarcações localizada até hoje.
Agora, com os filhos adultos e um novo veleiro, os Schurmann iniciam uma nova empreitada: a Expedição Oriente. Baseando-se em uma teoria do ex-comandante submarinista inglês Gavin Menzies, que acredita que, na realidade, foram os chineses os primeiros a dar a volta ao mundo, e não os espanhóis e ingleses – tendo, inclusive, descoberto a América e a Austrália anos antes do que seria registrado por Cristóvão Colombo e James Cook –, a família Schurmann percorrerá parte das rotas chinesas para de alguma forma tentar reescrever a história.
Assessorados à distância por Menzies, os Schurmann buscarão provas da passagem dos exploradores chineses pelos locais visitados.
Perspectiva: o Aysso, que abrigou os Schurmann nas duas primeiras voltas ao mundo, cabe dentro do Kat -- e sobra espaço (Foto: Tamara Fisch)
Perspectiva: o “Aysso”, que abrigou os Schurmann nas duas primeiras voltas ao mundo, cabe dentro do “Kat” — e ainda sobra espaço
A Expedição Oriente saiu de Itajaí (SC) neste domingo (21), e tem retorno previsto para o dia 22 de dezembro de 2016. Até lá, serão percorridas mais de 30 mil milhas (quase 50 mil quilômetros) no caminho que passará por 50 portos em 29 países. Desta vez, não vão todos os filhos — apenas Wilhelm estará presente durante todo o período –, mas a grande novidade é que um membro da terceira geração dos Schurmann fará a jornada: Emmanuel, filho mais velho de Pierre, se juntará ao tio e aos avós na Antártica, por onde a família vai passar pela primeira vez, e terminará a expedição com eles. David, o filho do meio, coordenará a equipe de terra da expedição, e Pierre continuará tocando projetos pessoais, como a empresa Bossa Nova Investimentos.
Especialmente para esta viagem, a família construiu um novo veleiro, oKat, cujo nome é uma homenagem à filha adotiva dos Schurmann, falecida em 2006, aos 13 anos. O Kat tem 80 pés (quase 25 metros), pesa 67 toneladas e comporta até catorze tripulantes em suas sete cabines. É o primeiro veleiro construído pela família, e também o mais tecnológico já utilizado por eles em uma expedição.
A construção do veleiro levou mais de dois anos. A ideia era que o lar marítimo dos Schurmann fosse inovador, eficiente e sustentável. Para isso, foram acrescentados ao barco vários itens inéditos. Há um sistema de geração de energia limpa, composto por turbinas eólicas, painéis solares, hidrogeradores e bicicletas ergométricas, que geram energia enquanto a tripulação se exercita.
Estima-se que 40% da energia utilizada pelo Kat possam ser produzidos por esses meios, minimizando o consumo de diesel. Todas as necessidades domésticas de energia serão supridas com fontes limpas, e o restante será alimentado por dois geradores com baixo consumo de combustível.
Além disso, o veleiro tem diversos equipamentos para evitar poluição. O lixo orgânico, por exemplo, é colocado em uma composteira para a geração de adubo para a horta que a família mantém a bordo; há, também, um sistema de tratamento das águas utilizadas no barco, que são descartadas com níveis de limpeza dentro dos limites internacionais.
A sustentabilidade é uma das principais características do veleiro Kat. Na foto, a composteira que recicla o lixo orgânico do barco (Foto: Tamara Fisch)
A sustentabilidade é uma das principais características do veleiro “Kat”. “Na” foto, a composteira que recicla o lixo orgânico do barco, que é transformado em adubo para a horta cultivada no barco
As outras marcas registradas do Kat são tão impressionantes quanto a sustentabilidade. No quesito eficiência, basta dizer que o plano é percorrer entre 180 e 200 milhas por dia (mais de 320 quilômetros). Além disso, a inovação está presente a todo momento: com transmissão de 600kbp/s, os Schurmann podem enviar dados, fotos e vídeos para atualizar o público sobre o andamento da viagem. O site da expedição, traduzido para quatro idiomas além do português, terá imagens novas a cada cinco minutos – há tripulantes especificamente para registrar o dia a dia e as possíveis descobertas.
Pode parecer uma viagem de férias, mas a família Schurmann garante que não é para qualquer um. A todo momento há um grupo de pessoas trabalhando – normalmente, as equipes são divididas em turnos de três horas. Cada tripulante tem sua função claramente definida, ou seja, não há folga, apenas um compromisso de dedicar os próximos dois anos de suas vidas à expedição.
O planejamento da Expedição Oriente foi extremamente trabalhoso. Os locais por onde passarão, o tempo de permanência em cada porto, a logística de tudo… Sem contar os novos desafios: em alguns canais da China, foi necessário checar se havia pontes pelas quais o Kat não conseguiria passar (o mastro mais alto do veleiro tem a altura de um prédio de quatro andares). Antes da partida, foi necessário listar todos os vistos e autorizações para entrar e navegar no território de todos os países que serão visitados e os procedimentos necessários para consegui-los. Meticulosidade foi um pré-requisito.
Ao zarpar de Itajaí (SC), os Schurmann se despedem de milhares de pessoas que acompanharam a preparação para a Expedição Oriente (Foto: Tamara Fisch)
Ao zarpar de Itajaí (SC), os Schurmann se despedem de milhares de pessoas que acompanharam a preparação para a Expedição Oriente
Itajaí, por ser uma cidade pequena (cerca de 200 mil habitantes e menos de 300 quilômetros quadrados), foi muito movimentada pela família Schurmann tê-la escolhido como sede para sua empresa. A comoção foi grande na hora da partida, com milhares de pessoas assistindo do porto e acenando carinhosamente aos doze tripulantes que zarparam no domingo. Pode-se esperar que o mesmo aconteça quando o Kat retornar, daqui a 27 meses.
http://veja.abril.com.br/blog/ricardo-setti/tema-livre/uma-pausa-em-assuntos-aridos-a-expedicao-oriente-terceira-volta-ao-mundo-da-familia-schurmann-em-veleiro-partiu-neste-domingo-de-itajai-sc-a-volta-so-daqui-a-mais-de-dois-anos/

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