sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

FELIZ 2021!

No ano passado...

Já repararam como é bom dizer "o ano passado"? É como quem já tivesse atravessado um rio, deixando tudo na outra margem...Tudo sim, tudo mesmo! Porque, embora nesse "tudo" se incluam algumas ilusões, a alma está leve, livre, numa extraodinária sensação de alívio, como só se poderiam sentir as almas desencarnadas. Mas no ano passado, como eu ia dizendo, ou mais precisamente, no último dia do ano passado deparei com um despacho da Associeted Press em que, depois de anunciado como se comemoraria nos diversos países da Europa a chegada do Ano Novo, informava-se o seguinte, que bem merece um parágrafo à parte:

"Na Itália, quando soarem os sinos à meia-noite, todo mundo atirará pelas janelas as panelas velhas e os vasos rachados".

Ótimo! O meu ímpeto, modesto mas sincero, foi atirar-me eu próprio pela janela, tendo apenas no bolso, à guisa de explicação para as autoridades, um recorte do referido despacho. Mas seria levar muito longe uma simples metáfora, aliás praticamente irrealizável, porque resido num andar térreo. E, por outro lado, metáforas a gente não faz para a Polícia, que só quer saber de coisas concretas. Metáforas são para aproveitar em versos...

Atirei-me, pois, metaforicamente, pela janela do tricentésimo-sexagésimo-quinto andar do ano passado.
Morri? Não. Ressuscitei. Que isto da passagem de um ano para outro é um corriqueiro fenômeno de morte e ressurreição - morte do ano velho e sua ressurreição como ano novo, morte da nossa vida velha para uma vida nova.

*Mario Quintana(1906-1994)


 

Joãozinho Doria, o pé de feijão e a vacina

 

Joãozinho Doria, o pé de feijão e a vacina

Joãozinho, não bastante ser muito rico, tinha sonhos de grandeza. Queria ser presidente. Dinheiro sem poder é só dinheiro. Poder, sem dinheiro é só poder. E Joãozinho sofria com isso. Os anos passavam e ele circulava assiduamente em meio aos poderosos. Entre suas muitas organizações se incluía a LIDE – Grupo de líderes empresariais que reunia anualmente empresários e poderosos figurões da política nacional num paraíso de Comandatuba (BA). Mas poder, mesmo, ele não tinha. Toda noite, ao contemplar estrelas pela janela do quarto, Joãozinho antevia crescer ali fora um gigantesco pé de feijão que o levaria até elas. Ele queria ser uma estrela luminosa na constelação do poder.

Foi assim que, depois de ocupar alguns cargos, Joãozinho se elegeu prefeito de São Paulo. Glória pequena para os anseios que lhe abrasavam o coração. Assumiu com aprovação de 44% e abandonou o posto, 16 meses depois, com apenas 18%. Queria ser governador de São Paulo.

Havia, porém, uma dificuldade. Como eleger-se governador, se rejeitado pelo povo da capital onde fora prefeito? Joãozinho tinha sua fada protetora. Como todas as fadas, bruxas e gnomos, a fada madrinha de Joãozinho Doria sabia, em 2018, o que apenas os grandes meios de comunicação e institutos de pesquisa, batendo pé no chão, se recusavam a ver: Bolsonaro, tapado de votos, seria presidente da República. E a fada levou-o até ele. Nasceu, ali, para Joãozinho, o que ele imaginava ser o pé de feijão que o levaria aos píncaros do poder político.

Eleito governador, graças ao apoio do capitão, que fez mais da metade dos votos em São Paulo no primeiro turno da eleição, e quase 70% dos votos no segundo turno, Joãozinho marcou território e tomou por inimigo aquele a quem devia sua vitória.

O pé de feijão, porém, em vez de crescer, encolheu. Em seguida sua rejeição voltava a superar sua aprovação. O coronavírus secara a terra? Joãozinho ficou muito triste vendo seu pé de feijão fenecer e flexionar até voltar ao chão. Enquanto isso acontecia, resolveu adotar como modelo o pior ministro do governo Bolsonaro, idolatrado, apesar disso, pela grande imprensa. Se o Mandetta usa o vírus para aparecer diariamente na TV e encanta esse jornalismo de poucas luzes, eu posso fazer a mesma coisa, deve ter pensado ele. E armou palanque paulistano com o noticiário do vírus. Era a exaustiva e depressiva receita da moda.

E o pé de feijão de Joãozinho Doria continuava, claro, sem tomar corpo.

Certo dia, a fada madrinha, já á beira de um ataque de nervos, enviou-lhe um comerciante chinês. O esperto mercador falou de uma vacina capaz de fazer o pé de feijão sarar seus males e crescer a perder de vista. No alto, haveria à sua espera uma harpa encantada, uma galinha poedeira de ovos preciosos, um gigante a derrotar e, claro, a ambicionada faixa de usar no peito.

***

As duas últimas pesquisas presidenciais são desalentadoras para Joãozinho Dória. Segundo Paraná Pesquisas (04/12), enquanto o atual presidente tem 36% das intenções de votos, seguido por Ciro Gomes com 12%, ele tem apenas 5%; a pesquisa Poder Data/Band (23/12), posterior, mostra Bolsonaro com 36%, Haddad com 13% e ele, Joãozinho, com apenas 3%. E a Coronavac do mercador chinês parece não ser lá essas coisas. Mas isso é outra história.

 

* Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.

*Percival Puggina

Jornal da Cidade