*José Pio Martins
O vocábulo “liberal” se presta a interpretações variadas, algumas contraditórias entre si. A confusão é grande. Nos Estados Unidos, liberal é quem defende mais governo e mais intervenção do Estado na vida das pessoas. Na Europa ocidental, onde nasceu o liberalismo, é o contrário. No Brasil, os esquerdistas usam o vocábulo “neoliberal” para xingar e diminuir seus adversários, quando foram os esquerdistas que inventaram essa palavra para pedir mais governo e mais intervenção do Estado nas questões sociais, mantido o liberalismo na economia.
Em sua origem, o liberalismo é a doutrina da liberdade, desenvolvida nos últimos 400 anos, e tem por base o reconhecimento de que o homem é livre por natureza e, portanto, a liberdade deve ser defendida e promovida. A Revolução Inglesa (1688), a Revolução Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789) foram feitas contra a opressão e a ditadura dos reis, contra os privilégios da Igreja e da nobreza, mas sobretudo para combater o controle do indivíduo pelo Estado.
O século 18 é denominado “o século das luzes” ou simplesmente “iluminismo”, cuja ideia central é de que o homem deve ser guiado pela luz da razão e não por superstição religiosa; por isso, a defesa da liberdade, do direito à livre expressão e da igualdade entre todos. Assim, a sociedade seria organizada por homens livres, mediante um “contrato social”, ou seja, um conjunto de leis votadas pelo Parlamento eleito pelo povo, com limitação dos poderes dos reis e dos governantes.
Acabava ali a história de que os reis eram infalíveis e seu poder tinha origem divina. A origem do poder seria o voto. Seria o fim do tempo em que o rei podia tudo: confiscar propriedades, sequestrar produção e matar indivíduos sem processo e sem direito de defesa. O liberalismo veio para promover a defesa do indivíduo contra agressões ou interferências sobre sua vida, sua liberdade e sua propriedade.
As leis científicas não mais seriam definidas pela Igreja, mas passariam a derivar de um método de investigação, observação, comparação, teste e comprovação – isto é, o método científico. A Igreja não podia mais executar quem dela discordasse, como fez com Giordano Bruno, morto na fogueira em 1600. Galileu escapou porque retirou a afirmação de que a Terra girava em torno do Sol e não o contrário, como dizia a Igreja.
Até o século 17, a humanidade só conheceu pobreza, miséria e fome. Foi a liberdade e o sistema de produção dela derivado – o capitalismo – que possibilitou o surgimento da abundância material. Em função dos problemas sociais, como a exploração do trabalho infantil e as más condições nas fábricas, surgiram as críticas, inclusive as de Karl Marx, e os anticapitalistas começaram a pregar outro sistema – o comunismo – cujo defeito maior, que viria a ser sua sentença de morte, era a supressão da liberdade. Está fadado ao fracasso todo regime que, para existir, dependa de eliminar o mais alto valor humano: a liberdade.
O liberalismo é a única doutrina capaz de promover o progresso e a paz considerando três características do ser humano: a imperfeição, a diferença individual e o egoísmo. Somos todos imperfeitos, diferentes e egoístas (egoísmo aqui é a simples defesa dos próprios interesses). Os governantes e os reis não são diferentes. Por isso, nenhum ser humano pode ter poderes ilimitados sobre minha vida, minha liberdade, minha propriedade e meus atos. Devo obediência, sim, às regras de convívio social inscritas em leis votadas por todos. Ser liberal é isso.
José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.
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