quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Estudantes ou vagabundos profissionais?

Extremista da USP tenta, aos berros, impedir professora de trabalhar e diz que o verdadeiro saber está na assembléia, não na sala de aula

Já disse que fiz coisas no movimento estudantil de que não me orgulho tanto assim, embora os tempos fossem outros — quase sempre para o mal, por causa da ditadura; em alguns aspectos, no entanto, para o bem: éramos educados e, entre outras coisas, respeitávamos os professores.
Recebo de uma professora do Departamento de Lingüística (ainda estou na pré-reforma, mestra, em sinal de protesto!) o comentário que segue. Se ela autorizar depois, publico o seu nome. Leiam. Volto em seguida.
Reinaldo,
Tive hoje uma experiência extremamente triste. Sou professora no Departamento de Linguística da USP desde 2007 e passei pelas greves de costume, tanto de professores quanto de alunos (!), mas, hoje, a situação passou dos limites. Nunca aderi às greves, pois prezo meus alunos de graduação e não acho justo prejudicar sua formação por motivos banais. Portanto, sempre furo as greves e nunca fui desrespeitada por causa disso. No entanto, isso mudou hoje.
Quando eu me aproximava da sala para a aula das 19h30, uma mulher (não sei se aluna ou não) tirava carteiras da sala, dizendo aos alunos que não haveria aula. Interrompi, dizendo que haveria aula, sim. Foi quando vi a fúria em seu olhar. Ela, aos gritos, dizia que sou desinformada, que não sabia da deliberação da assembleia, que tinha decidido pela greve com piquete. Eu tentei dizer que era um absurdo ela concluir que, se eu não aderi, é porque sou desinformada. Existe a opção de eu não ter aderido porque penso diferente.
Ela se exaltou e me disse diversos desaforos. O mais absurdo: [segundo ela] o que eu iria ensinar hoje à noite era inútil. O verdadeiro aprendizado estava lá fora, na assembleia. Fiquei horrorizada com tamanho desrespeito pelo professor e pelo ensino. Perdi as estribeiras e a enxotei da sala, sob aplausos dos alunos querendo aula (apenas uns 10 conseguiram entrar no prédio…)
Agora veja você: ela negou, sem perceber, a própria universidade. O saber, o conhecimento científico que eu iria passar aos meus alunos, é, pra esse povo, inútil! O que essas pessoas fazem na universidade então?
VolteiEis aí. Se o “verdadeiro aprendizado está na assembléia”, então a universidade perde a razão de ser e vira mero pretexto para a “luta revolucionária”. Santo Deus! Ter de escrever isso em 2011!!! A truculência é espantosa! Até porque os professores não estão em greve, nem mesmo aquela paralisação que costuma ser decretada pela meia-dúzia de militantes da Adusp.
Diante de um depoimento como esse, fico pensando em professores da universidade como Eugênio Bucci — que resolveu dar uma aula pública, num sinal de apoio aos militantes — ou neste lamentável Vladimir Safatle, que endossa, com seus argumentos furados, a truculência.
É preciso que também a maioria silenciosa dos 5.200 professores da USP comece a se manifestar. Será que o Brasil lutou para se livrar de duas ditaduras instituídas num intervalo de 27 anos, que duraram, juntas, quase 30 anos, para que grupelhos de extremistas pudessem violar dispositivos fundamentais da Constituição democrática?
Aquela mulher que teve um ataque de fúria contra uma professora agrediu todos os docentes da USP e a razão de ser da universidade.
Por Reinaldo Azevedo

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