Ex-presidente do STF falou sobre declarações da petista, que disse 'não respeitar delator' e comparou delação premiada à tortura
Joaquim Barbosa em sua última sessão no Supremo Tribunal Federal(Pedro Ladeira/Folhapress/Folhapress)
O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa comentou na madrugada desta terça-feira as declarações da presidente Dilma Rousseff, em Washington, sobre o depoimento demolidor do empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC Engenharia, segundo quem a campanha da petista foi abastecida com dinheiro desviado de contratos da Petrobras. Barbosa afirma que nunca viu um chefe de estado tão mal assessorado como Dilma - e lembra a presidente que "zelar pelo respeito e cumprimento das leis do país é uma das mais importantes missões constitucionais de um presidente da República".
Questionada sobre as declarações de Pessoa, trazidas à luz por VEJA, Dilma proferiu a seguinte declaração: "Eu não respeito delator. Até porque eu estive presa na ditadura e sei o que é. Tentaram me transformar em uma delatora". Depois, a presidente recorreu aos livros de História. "Há um personagem que a gente não gosta, porque as professoras nos ensinam a não gostar dele. E ele se chama Joaquim Silvério dos Reis, o delator. Eu não respeito delator", afirmou, mencionando o homem que traiu os inconfidentes em Minas Gerais.
"A assessoria da presidente deveria ter-lhe informado o significado da expressão 'law enforcement': cumprimento e aplicação rigorosa das leis", escreveu o ex-ministro.
Barbosa classificou a resposta da presidente como uma tentativa de "'investir politicamente' contra as leis vigentes, minando-lhes as bases". "Caberia à assessoria informar a presidente que: atentar contra o bom funcionamento do Poder Judiciário é crime de responsabilidade!", afirmou o ex-presidente do STF, que encerra: "Reflitamos coletivamente: vocês estão vendo o estrago que a promiscuidade entre dinheiro de empresas e a política provoca nas instituições?". "Esqueci de dizer: 'colaboração' ou 'delação' premiada é um instituto penal-processual previsto em lei no Brasil! Lei!!!".
Hoje é celebrado o Dia do Motorista, de São Cristóvão e dos caminhoneiros. Mas não foi dia dos caminhoneiros mês passado? E em setembro, não é nosso dia também? São muitas as dúvidas sobre a data em que os estradeiros comemoram a sua profissão. Por isso vamos tentar esclarecer esta pequena confusão.
Dia 25 de julho é o Dia de São Cristóvão. Diz a história que Cristóvão era um homem forte e robusto, que estava em busca de servir ao mais poderoso de todos os homens. Quando descobriu que este homem era Jesus, converteu-se e passou a morar na margem de um rio, onde ajudava pessoas a atravessá-lo de uma margem a outra. Um dia ele transportou um menino em seus ombros, que ficava mais pesado a cada passo. Quando Cristóvão reclamou que parecia que carregava o mundo nas costas, o menino falou: “Não carregas o mundo, carregas seu criador. Sou Jesus, aquele a quem serves”. Por isso São Cristóvão é tido como o padroeiro dos motoristas e caminhoneiros. Esta data existe desde o século XV, sendo a mais antiga e mais lembrada pelos estradeiros.
Já o dia 30 de junho foi instituído como o Dia do Caminhoneiro em 1986, no Estado de São Paulo, pelo governador Franco Montoro. É uma data de celebração regional.
E, pra complicar um pouco mais, em 2009 o presidente em exercício José Alencar institui o dia 16 de setembro como Dia Nacional do Caminhoneiro.
Para nós, todo dia é dia de homenagear os guerreiros que encaram o trecho e colaboram para o progresso do país. Parabéns para todos!
Aproveite e estampe no seu Facebook o orgulho de ser caminhoneiro: acesse nosso site e modifique sua foto de perfil e troque a imagem de capa.
Dinheiro ilegal doado para candidatos dentro da lei é crime? É a primeira questão levantada pela delação premiada do dono da UTC
Ricardo Pessoa revela detalhes do esquema de corrupção da Petrobras e entrega a lista dos beneficiados com o dinheiro desviado: as campanhas eleitorais de Dilma e Lula, deputados, senadores e ministros do governo(VEJA.com/VEJA)
O engenheiro Ricardo Pessoa, dono da construtora UTC, tem contratos bilionários com o governo, é apontado como o chefe do clube dos empreiteiros que se organizaram para saquear a Petrobras e cliente das palestras do ex-presidente Lula. Desde a sua prisão, em novembro passado, ele ameaça contar com riqueza de detalhes como petistas e governistas graúdos se beneficiaram do maior esquema de corrupção da história do país. Nos últimos meses, Pessoa pressionou os detentores do poder - por meio de bilhetes escritos a mão - a ajudá-lo a sair da cadeia e livrá-lo de uma condenação pesada. Ao mesmo tempo, começou a negociar com as autoridades um acordo de delação premiada. o empresário se recusava a revelar o muito que testemunhou graças ao acesso privilegiado aos gabinetes mais importantes de Brasília. O Ministério Público queria extrair dele todos os segredos da engrenagem criminosa que desviou pelo menos 6 bilhões de reais dos cofres públicos. Essa negociação arrastada e difícil acabou na semana passada, quando o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), homologou o acordo de colaboração entre o empresário e os procuradores.
VEJA teve acesso aos termos desse acerto. O conteúdo é demolidor. As confissões do empreiteiro deram origem a 40 anexos recheados de planilhas e documentos que registram o caminho do dinheiro sujo. Em cinco dias de depoimentos prestados em Brasília, Pessoa descreveu como financiou campanhas à margem da lei e distribuiu propinas. Ele disse que usou dinheiro do petrolão para bancar despesas de 18 figuras coroadas da República. Foi com a verba desviada da estatal que a UTC doou dinheiro para as campanhas de Lula em 2006 e de Dilma em 2014. Foi com ela também que garantiu o repasse de 3,2 milhões de reais a José Dirceu, uma ajudinha providencial para que o mensaleiro pagasse suas despesas pessoais. A UTC ascendeu ao panteão das grandes empreiteiras nacionais nos governos do PT. Ao Ministério Público, Pessoa fez questão de registrar que essa caminhada foi pavimentada com propinas. Altas somas. O empreiteiro delatou ao STF essas somas que entregou aos donos do poder, segundo ele, mediante achaques e chantagens. Relatou que teve três encontros em 2014 com Edinho Silva, tesoureiro da campanha de Dilma e atual ministro de Comunicação Social. Nos encontros, disse, ironicamente, ter sido abordado "de maneira bastante elegante". Contou ele: "O Edinho me disse: 'Você tem obras na Petrobras e tem aditivos, não pode só contribuir com isso. Tem que contribuir com mais. Eu estou precisando'". A abordagem elegante lhe custou 10 milhões de reais, dados à campanha de Dilma. Um servidor do Palácio chamado Manoel de Araújo Sobrinho acertou os detalhes dos pagamentos diretamente com Pessoa. Documentos entregues pelo empresário mostram que foram feitos dois depósitos de 2,5 milhões de reais cada um, em 5 e 30 de agosto de 2014. Depois dos pagamentos, Sobrinho acertou com o empreiteiro o repasse de outros 5 milhões para o caixa eleitoral de Dilma. Pessoa entregou metade do valor pedido e se comprometeu a pagar a parcela restante depois das eleições. Só não cumpriu o prometido porque foi preso antes. Doar para campanhas não é crime, desde que a operação seja declarada e os recursos tenham origem lícita. Foi assim? Pessoa deixou claro que não. "O senhor tem obras no governo e na Petrobras. O senhor quer continuar tendo?", disse-lhe Edinho Silva. Fica a indagação para a Justiça: ameaçar doadores de campanha é lícito?
A lista dos favorecidos
Valores
Campanha de Dilma em 2014
7,5 milhões de reais
Campanha de Lula em 2006
2,4 milhões de reais
Ministro Edinho Silva (PT)
*
Ministro Aloizio Mercadante (PT)
250.000 reais
Senador Fernando Collor (PTB)
20 milhões de reais
Senador Edison Lobão (PMDB)
1 milhão de reais
Senador Gim Argello (PTB)
5 milhões de reais
Senador Ciro Nogueira (PP)
2 milhões de reais
Senador Aloysio Nunes (PSDB)
200.000 reais
Senador Benedito de Lira (PP)
400.000 reais
Deputado José de Fillipi (PT)
750.000 reais
Deputado Arthur Lira (PP)
1 milhão de reais
Deputado Júlio Delgado (PSB)
150.000 reais
Deputado Dudu da Fonte (PP)
300.000 reais
Prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT)
2,6 milhões de reais
O ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto
15 milhões de reais
O ex-ministro José Dirceu
3,2 milhões de reais
O ex-presidente da Transpetro Sergio Machado
1 milhão de reais
* Como tesoureiro, arrecadou dinheiro para a campanha de Dilma de 2014
Dilma com Obama na Casa Branca em abril de 2012. Tempos mais leves para a presidente
Barack Obama e Dilma Rousseff jantam nesta segunda-feira na Casa Branca e na terça-feira haverá reunião de trabalho. Ótimo jantar e bons negócios. Falo isso sabendo de todas as dificuldades objetivas, do desconforto que este governo da República do Pixuleco significa para mim pessoalmente e com o noticiário sobre o Brasil mais para página policial do que de geopolítica ou de negócios.
No entanto, torço pelo Brasil. Espero que nesta ofensiva desesperada, o governo consiga atrair investimentos estrangeiros e de fato recalibre seus laços com o parceiro tradicional.
Eu quero o Brasil no lado certo da história, sem discurseira antiamericana chulé. Eu quero o Brasil integrado com os setores de ponta da economia global. Tudo bem exportar commodities para a China, mas o Brasil realmente precisa dinamizar suas parcerias quando existem lances históricos para a concretização de acordos comerciais dos EUA na área do Pacífico e com a Europa. Espero que se concretize a meta chutada por funcionários americanos e brasileiros de dobrar o comércio entre os dois países em dez anos.
Estou aqui fazendo muita torcida estratégica num cenário inglório e incerto. Não é mole ter alguém como Dilma Rousseff para tentar vender o peixe na forma e no conteúdo, vender a tal agenda positiva. Imaginem se o ministro Joaquim Levy não conseguisse estar presente nas conversas e seminários em Nova York, Washington e San Francisco para falar em português, inglês e sensatês?
Meu título lá em cima é meio apelativo (no caso do Obama, hehehe). Sobre Dilma é mais pertinente. Claro que a leitura está aberta. E vou manter a charada. No entanto, não quero desgalhar demais e vou focar. Dilma não se manca, pois ela tem uma visão errada das coisas.
Foi preciso o país chafurdar no lodaçal em todos os sentidos para que a presidente aparentemente abandonasse ideias e planos, dignos de um projeto desenvolvimentista estatizante e anacrônico (nem estou discutindo mera incompetência ou pedaladas fiscais). Hora de buscar investimentos em infraestrutura com mais flexibilidade lá fora (aqui).
Claro que existem oportunidades no Brasil. O país está mais barato e isso por “obra” deste governo que aos trancos e barrancos tenta sair do fundo do poço, topando qualquer negócio. No entanto, como confiar nesse governo? E como alertou aquele que deveria ser o ministro da Fazenda, Arminio Fraga, em entrevista à Folha, “infelizmente não chegamos ao fundo do poço”.
Sobre o interlocutor de Dilma, quem sabe ele até tenha começado um caminho de volta, do fundo do poço. Barack Obama, o pato manco (presidente americano em final de mandato), caminha com mais firmeza. Ele conseguiu na semana passada vitórias históricas no Congresso e na Corte Suprema, ao ganhar autoridade forte para negociar acordos comerciais no mundo, a ratificação do seu programa de saúde e a aprovação do casamento gay.
A polarização segue ácida, mas houve provas de cooperação bipartidária (na questão comercial), sem falar do espírito de união nacional depois da chacina racista em Charleston.
Muita piada foi feita semanas atrás com uma pesquisa mostrando que George W. Bush era mais popular do que Obama. Comparação boba, sem parâmetro (a pesquisa mostrou que Jimmy Carter era mais popular que Obama e também Bush). Na mais recente pesquisa Wall Street Journal/NBC News, aprovação de 48% e rejeição de 48% para Obama (em setembro passado, a rejeição era de 54%). No mesmo momento do segundo mandato, a aprovação de Bush era de 29%.
Claro que até entregar as chaves da Casa Branca em janeiro de 2017, o pato manco Obama pode tropeçar bastante. Em termos imediatos (agora mesmo), vamos esperar os desdobramentos globais da crise da pequena Grécia. Ademais, a penosa negociação nuclear iraniana pode estar finalmente chegando nos conformes (Obama considera a finalização do acordo um dos pilares do seu legado).
Não está garantido o acordo e se acontecer pode ser o estouro da boiada de setores contrários no Congresso e de aliados dos EUA no Oriente Médio (Israel e Arábia Saudita). Tudo isso rolando enquanto dona Dilma tenta vender o Brasil nos States. Duro para os americanos manterem o foco no Brasil esta semana.
E para arrematar, uma nota leve. Nesta terça-feira, enquanto Obama e Dilma têm a reunião de trabalho, Chris Christie, o meu governador (New Jersey), talvez anuncie sua entrada na corrida para tentar pegar a vaga de Obama. Será o pretendente de número 13 nas primárias republicanas. Chris Christie nega as informações vazadas de que esteja pronto para anunciar a decisão. Governador, se manca.
Procurador-geral da República segue em campanha para permanecer no cargo
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que está em campanha para ser reconduzido ao cargo máximo do Ministério Público Federal(Ueslei Marcelino/Reuters)
Em campanha para permanecer à frente do comando do Ministério Público Federal, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse nesta segunda-feira, em um debate com candidatos que disputam a cadeira com ele, que o escândalo do petrolão é um "descomunal caso de corrupção".
Janot afirmou que o país passa por um "grave momento" e pediu votos de integrantes do Ministério Público para continuar uma trajetória que, segundo ele, permitiu que o órgão atuasse com "profissionalismo" e "maturidade" em um momento em que o MP "é chamado a dizer por que veio".
Rodrigo Janot concorre com os subprocuradores-gerais da República Carlos Frederico Santos, Mario Bonsaglia e Raquel Dodge a indicação para compor a lista tríplice a ser encaminhada à presidente Dilma Rousseff. Tradicionalmente, é escolhido como procurador-geral o mais votado na lista enviada ao Executivo. A eleição para a formação da lista tríplice será realizada no dia 5 de agosto.
É sempre assim. Tão logo se descobre que outra reportagem de VEJA vai reiterar que sábado é o mais cruel dos dias para quem tem culpa no cartório, recomeça a apresentação da ária mais enfadonha da Ópera dos Malandros. É aquele em que o que há de mais repulsivo no elenco da peça produzida, dirigida e estrelada por Lula volta ao palco para ensinar à plateia que verdade é mentira.
Tem sido assim desde a descoberta do Mensalão em meados de 2005. De lá para cá, os canastrões em cena capricham na pose de vítima e repetem as mesmas falas. Os culpados são inocentes. O xerife é o vilão. É tudo invencionice da imprensa reacionária a serviço da elite golpista. O que parece comissão é uma contribuição financeira espontânea e legal. Os responsáveis pela infâmia serão imediatamente processados. E tome conversa de 171.
Não poderia ser diferente neste fim de semana especialmente pressago para celebrantes de missa negra. Apavorado com a reportagem de capa de VEJA, que enfileirou em 12 páginas a essência dos depoimentos prestados pelo empreiteiro Ricardo Pessoa, o rebanho que acompanha o sinuelo sem rumo nem esperou pela chegada às bancas da presente edição da revista para balir em coro que está em curso mais uma trama sórdida contra o PT.
Como confiar na palavra de um bandido confesso, e ainda por cima delator?, recitam os filiados ao partido que virou bando. Para a companheirada, só é criminoso um parceiro de maracutaias que, em troca dos benefícios reservados aos que aceitam colaborar com a Justiça, decide contar o que fez, revelar o que sabe e identificar os comparsas. É o caso de Pessoa. Até recentemente um generoso amigo de Lula, agora é o inimigo número 1 dos embusteiros no poder.
Coerentemente, os lulopetistas insones com o ruído do camburão enxergam guerreiros do povo brasileiro em todos os delinquentes que se mantêm de boca fechada — só abrem o bico para mentir. Nada fizeram de errado. Como não aconteceram os crimes que cometeram a mando e sob a proteção dos chefões, não há nada a confessar.
Quem opta pelo silêncio mafioso, como Delúbio Soares no caso do Mensalão ou João Vaccari Neto agora, tem vaga na confraria dos heróis de chanchada, composta por inocentes difamados e ofendidos por direitistas tão inimigos do povo que caem fora do avião ainda na pista quando um ex-pobre se instala na poltrona ao lado.
Além da desqualificação do acusador, o manual da esperteza companheira ordena o sepultamento da prova testemunhal. Se não estiver amparada em provas materiais, toda acusação deve ser rebaixada a fofoca. Para azar dos cleptocratas liberticidas, Ricardo Pessoa juntou aos depoimentos uma pilha de documentos e planilhas com extraordinário teor explosivo. E nem precisava, avisa a consistência das declarações do empreiteiro.
Os depoimentos de Pessoa confirmam que o poder de fogo da prova testemunhal é determinado pelo volume e pela qualidade dos detalhes. Neles é que mora o perigo. Afirmar que João Vaccari Neto recolhia pessoalmente a parte do PT no produto do roubo põe o acusado nas cercanias do tribunal. O banco dos réus fica bem mais próximo quando se acrescenta que a alcunha do coletor de propinas — Moch — foi sugerida pela mochila permanentemente pendurada no ombro. Saber que o tesoureiro gatuno chamava propina de “pixuleco” fecha o círculo que lembra o de uma algema.
Detalhes do mesmo calibre também demoliram a piada do chefe que se mete em tudo mas nunca sabe de nada se o caso de polícia envolve parentes, amigos, ministros de confiança e outros meliantes de estimação. “Segundo Ricardo Pessoa”, lê-se na reportagem de VEJA, “a UTC deu 2,4 milhões de reais em dinheiro vivo para a campanha à reeleição de Lula, numa operação combinada diretamente com José de Filippi Júnior, que era o tesoureiro da campanha e hoje é secretário de Saúde da cidade de São Paulo”.
As minúcias seguintes atestam que os saqueadores da Petrobras se valiam de métodos que fundiam cuidado e descuido. Ficou estabelecido que os pacotes de dinheiro seriam levados ao comitê da campanha de Lula por Pessoa, por Walmir Pinheiro, executivo da UTC, ou por um emissário ungido por ambos. “Para não chamar a atenção de outros petistas que trabalhavam no local”, prossegue o relato, “a entrega da encomenda era precedida de uma troca de senhas entre o pagador e o beneficiário”.
Ao chegar à cena do crime, o homem da mala deveria sacar da garganta três consoantes e três vogais: “Tulipa”, dizia. E só subia depois de ouvir a contra-senha que também agrupava uma trinca de consoantes e outra de vogais: “Caneco”. As duas palavras remetem a chope e cerveja. Chope e cerveja têm tudo a ver com “Brahma”. “Brahma” era o codinome que uma ala da quadrilha usou para referir-se ao ex-presidente em emails capturados pela Lava-Jato. O resultado da soma da senha, da contra-senha e do codinome é a traseira de um camburão.
No Brasil Maravilha que Lula pariu e Dilma amamenta, surtos de criatividade cretina são cada vez mais frequentes. Não se deve estranhar que, entre um assalto e uma lavagem de dinheiro, os larápios do Petrolão tenham inventado o que se pode chamar de imprudência cuidadosa. Ou cautela de altíssimo risco.
Operação Erga Omnes — a expressão latina usada pela Polícia Federal significa “Contra Todos”, ou “A Todos Atinge”. E já atingiu boa parte do todo: os grupos Odebrecht e Andrade Gutierrez. Um dos detidos é Alexandrino Alencar. De acordo com publicação oficial da Odebrecht(anúncio em O Globo de 13 de abril de 2014), Alencar é seu diretor de Relações Institucionais e foi quem contratou o ex-presidente Lula para participações remuneradas em eventos no Exterior; e, “neste tipo de ação, de estímulo à exportação de bens e serviços, é comum que fornecedores e subcontratistas participem dos esforços e arquem com alguns custos” (OK: quando uma empresa contrata alguém, paga suas despesas, além da remuneração. A Odebrecht contratou também Fernando Henrique e o ex-primeiro-ministro espanhol Felipe González. Mas três delatores premiados da Operação Lava-Jato citaram Alexandrino Alencar como pagador de propinas no Exterior já na época dos Governos petistas. A Odebrecht é a empreiteira que obteve mais empréstimos do BNDES lulista para obras no Exterior. A segunda é a Andrade Gutierrez.
Empreiteiras sempre tiveram boas relações com todos os Governos. Mas a Andrade Gutiérrez, atingida agora, tem relações ainda melhores com Lula. Foi em Paris, na casa de Marília Andrade, da família controladora da Andrade Gutiérrez, que a filha de Lula, duramente exposta na campanha eleitoral que elegeu Collor, passou quase um ano; o então marido de Marília, Luís Favre, trotsquista, se ligou a Lula, e levou boa parte dos trotsquistas brasileiros para o PT.
Onde mora o perigo Marcelo Odebrecht está preso, à disposição do juiz Sérgio Moro, que já obteve várias delações premiadas. Mas a questão é outra: o pai de Marcelo, Emílio Odebrecht, presidente do Conselho da empresa, não tem paciência com tergiversações.
Se achar que as coisas passaram dos limites, haverá problemas.
Erga omnes E que ninguém se iluda: tanto a Odebrecht quanto a Andrade, se têm excelentes relações com o PT, têm também ótimo relacionamento com os demais partidos. Fernando Henrique, como Lula, fez palestras e viagens remuneradas pela Odebrecht. E as duas empresas, embora tenham ganho grande impulso nos Governos petistas, não entraram nos negócios só em 2003, quando Lula assumiu seu primeiro mandato.
Se quiserem falar, têm o que contar e sobre quem contar.
Maduro, quase podre Há coisas espantosas na violência praticada por hordas fascistas na Venezuela contra senadores brasileiros que foram visitar presos políticos. A primeira é a rapidez com que bolivarianos brasileiros, ávidos em demonstrar fidelidade ao presidente venezuelano, tentaram ridicularizar a visita, minimizar as agressões e fingir acreditar na fábula do congestionamento de trânsito que ocorria por acaso bem na hora do desembarque. O sumiço do embaixador brasileiro no momento do cerco foi muito conveniente. E a servil nota oficial do Governo Dilma, pedindo por favor à Venezuela que preste “os devidos esclarecimentos” é coroada por um ato falho: diz que o embaixador brasileiro, chamado ao aeroporto pelos senadores, retornou ao aeroporto e “os despediu”.
A vontade de governar sem Congresso é tanta que acham que um diplomata pode demitir parlamentares.
O lado ruim Viajar é bom, é de graça, rende diárias, dá notícia. E outro grupo de senadores decidiu ir a Caracas “com isenção e imparcialidade”. Quem são os isentos e imparciais? Roberto Requião, fã declarado de Maduro, Lindbergh Farias (o antigo cara-pintada), Vanessa Grazziotin, do PCdoB e Randolfe Rodrigues, do PSOL (o de Luciana Genro).
Bolivarianamente imparciais e isentos e doidos para viajar.
O lado bom Mas a ação hostil em Caracas tem aspectos positivos: tira a máscara do Governo venezuelano, acaba com aquela frase de Lula, de que na Venezuela há democracia até demais, mostra quem são os brasileiros que, por motivos ideológicos, se subordinam a um Governo estrangeiro. E pode causar danos ao Mercosul – uma boa ideia que se esclerosou, se ideologizou e isolou o Brasil dos principais movimentos do comércio internacional, que tanto beneficiam o Chile e o Peru.
Um erro, uma vida O deputado cearense Paes de Andrade fez uma bela e corajosa carreira. Na fase mais difícil da ditadura, foi um dos líderes do Grupo Autêntico do MDB, que se opôs com decisão aos militares (e teve muitos integrantes cassados por isso). Formou afinada dupla com Ulysses Guimarães, o Senhor Diretas, líder da resistência pacífica ao autoritarismo — tanto que, quando Ulysses deixou a Presidência da Câmara, apoiou Paes de Andrade para substituí-lo.
Paes de Andrade estava no cargo quando o presidente Sarney viajou para o Exterior e coube-lhe substituí-lo. Cedeu então ao provincianismo: voou no avião presidencial para sua cidade, Mombaça, Ceará, para ser aclamado e lembrado como primeiro presidente a visitá-la. Caiu no ridículo. Foi apelidado de Mombaça.
E ao morrer, dia 17, o fato mais lembrado em sua biografia foi a desnecessária viagem presidencial.
A Polícia Federal rastreia viagens do ex-presidente ao exterior – entre elas as realizadas ao lado de Alexandrino, preso na Lava Jato
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva acomodava-se no Gulfstream G200, avião executivo com altura de cabine de quase 2 metros, naquele 21 de maio de 2011. O jatinho é um dos maiores de sua classe, a executiva. Tem mesa de reunião, acabamento em madeira de lei e pontos USB para laptops. A viagem de cerca de 5.000 quilômetros do Panamá a São Paulo aconteceu na aeronave prefixo PR-WTR. Lula não estava sozinho. Voava ao lado do lobista da Odebrecht Alexandrino Alencar, preso recentemente na Operação Lava Jato, acusado de ajudar a empreiteira a operar as propinas do petrolão no exterior. Alexandrino pediu demissão na semana passada de seu cargo na Odebrecht e teve a prisão preventiva decretada pelo juiz Sergio Moro. Em seu despacho, Moro escreveu: “Além das provas em geral do envolvimento da Odebrecht no esquema criminoso de cartel, ajuste de licitações e de propina, há prova material de proximidade entre Alberto Youssef e Alexandrino Alencar”. Naquele dia de maio de 2011, Lula passou pelo sistema de migração da Polícia Federal às 7h07; o lobista, quatro minutos depois. Estavam juntos, como juntos estavam em mais aventuras do que admitem até hoje.
ÉPOCA obteve um relatório da PF com as entradas e as saídas do Brasil de Lula e do lobista Alexandrino, entre 2011 e o início deste ano. Há a comprovação de duas viagens da dupla, que já haviam sido noticiadas (para Cuba e para Guiné Equatorial), e a revelação de que ambos estiveram juntos em mais quatro ocasiões (nessa viagem para o Panamá; numa outra para Colômbia, Peru e Equador; numa terceira para Portugal; e numa quarta para a África, passando porAngola e Gana). Além de atestar que a relação de Lula e Alexandrino era muito próxima, as planilhas da PF permitem, pela primeira vez, conhecer o sistema Uber particular de Lula – quem banca e como viaja o ex-presidente pelo mundo afora. São 78 trechos internacionais. As planilhas não identificam destino e origem das viagens. Mas apontam quem são os donos das aeronaves: em alguns casos, empreiteiras, bancos, importadores e companhias têxteis. Em outros, empresas alugando jatinhos de companhias de táxi-aéreo.
As viagens de Lula e Alexandrino não foram ocasionais. Os dois são amigos. Depois das viagens que faziam juntos, costumavam se cumprimentar com afetuosos beijos no rosto. Na sala de Alexandrino, na sede da Odebrecht em São Paulo, uma foto com Lula dividia espaço com retratos de familiares do executivo. Quando se referia a Lula, Alexandrino o chamava de “presidente” ou de “chefe” – deferência não dispensada nem sequer ao próprio Marcelo Odebrecht.
Tamanha era a intimidade entre os dois que Alexandrino acompanhava Lula em reuniões e eventos restritos a autoridades de Estado, mesmo quando o tour não era bancado exclusivamente pela Odebrecht. Numa excursão pela América do Sul, Lula viajou com uma comitiva de executivos da OAS, da Camargo Corrêa, da Andrade Gutierrez e da onipresente Odebrecht – todas acusadas de participar do cartel do petrolão. A viagem começou pela Colômbia: Lula embarcou em 3 de junho de 2013, às 9h41, de São Paulo para Bogotá. Lula foi a bordo do mesmo jatinho que o levara ao Panamá, dois anos antes. O lobista da Odebrecht (Alexandrino, não Lula) havia embarcado horas antes, às 7h39, para a capital colombiana. Lá, eles se encontraram com o presidente do país, Juan Manuel Santos, e participaram de encontros com empresários. Lula e Alexandrino seguiram então para o Peru, onde foram recebidos pelo então chefe de Estado, Ollanta Humala. Em fotos oficiais, o lobista da Odebrecht aparece a um passo de Lula. Os dois não param de rir. O périplo político da dupla terminou no dia 8 de junho de 2013, data em que ambos regressaram ao Brasil, em voos diferentes.
Em encontros com autoridades estrangeiras, Lula sempre defendia o interesse das empresas brasileiras em fazer negócios com o país de destino. “Por isso, a gente fazia questão de bancar as viagens dele”, disse um executivo de uma grande empreiteira antes de ser preso na última fase da Lava Jato. O investimento se mostrava certeiro. Em 13 de março de 2013, por volta das 8 horas, Lula e Alexandrino embarcaram no aeroporto de Guarulhos com destino a Nigéria, Benin, Gana e Guiné Equatorial. Quatro meses depois dessa passagem de Lula pela África, a Odebrecht ganhou um contrato de uma obra de transporte com o governo ganês, contando com US$ 200 milhões do BNDES. Em 17 de abril do mesmo ano, o presidente de Gana, John Mahama, visitou o Brasil para lançar o seu livro Meu primeiro golpe de Estado. Aproveitou para ter reuniões reservadas com Lula e representantes da Odebrecht, segundo telegramas do Itamaraty.
Em alguns casos, era o próprio Lula quem decidia quando e para onde queria viajar. Em mensagens de celular enviadas em 12 de novembro de 2013, Léo Pinheiro, presidente da construtora OAS, outro amigo de Lula preso na Lava Jato, e o diretor da área internacional da companhia, Augusto César Uzeda, acertavam detalhes dos preparativos para uma viagem do petista, a quem chamam de “Brahma”. “O Brahma quer fazer a palestra dia 24/25 ou 26/11 em Santiago”, diz Léo Pinheiro. “Amanhã começamos a organizar, o avião é por nossa conta”, escreve Uzeda. No dia 26 de novembro, às 10h53, conforme o combinado, o ex-presidente passou pela imigração e, em seguida, embarcou no mesmo Gulfstream G200, alugado da Global Aviation. No Chile, ele participou do seminárioDesenvolvimento e integração da América Latina. No dia 10 de dezembro de 2013, um consórcio integrado pela OAS, a sul-coreana Hyundai, a francesa Systra e a norueguesa AasJakobsen venceu a licitação para a construção de uma ponte de 2.750 metros sobre o Canal de Chacao, considerado o mais longo da América Latina, depois de apresentar a única oferta. O valor estimado do investimento da obra é de US$ 680 milhões.
Numa viagem de Lula e Alexandrino para Cuba, República Dominicana e Estados Unidos, em janeiro de 2013, a Odebrecht pagou, por meio de sua parceira comercial D.A.G. Construtora, R$ 435 mil para fretar uma aeronave da Líder Táxi-Aéreo, segundo revelou o jornal O Globo em abril deste ano. Em 2011, Lula incluiu Alexandrino numa viagem à Guiné Equatorial em que ia como chefe da delegação brasileira participar da Assembleia da União Africana, de acordo com reportagem da Folha de S.Paulo.
Documentos obtidos por ÉPOCA revelam que empresas de diversos setores bancaram as viagens de Lula pelo mundo afora. Ainda no ramo das empreiteiras, no dia 5 de setembro de 2011, por volta das 11h30, o ex-presidente embarcou numa aeronave modelo Falcon 900EX Easy no aeroporto internacional do Recife. A operadora do jato é a Morro Vermelho Táxi-Aéreo, do grupo Camargo Corrêa – que, além de cobrir as despesas com o avião, doou R$ 3 milhões ao Instituto Lula e repassou R$ 1,5 milhão para a empresa do líder petista LILS Palestras Eventos e Publicidade entre 2011 e 2013. Meses antes, em fevereiro, Lula viajara a bordo de um Cessna C750, dacompanhia têxtil Coteminas, do empresário Josué Gomes da Silva, e embarcara num Bombardier BD-700 Global Express, pertencente àmineradora Vale, com destino a Guiné, onde participou de um evento de início das obras de reconstrução de uma ferrovia.
Outros aviões de grandes empresários brasileiros também já estiveram à disposição das viagens do ex-presidente petista entre 2011 e 2014: o de Sérgio Habib, da montadora JAC Motors; o de José Seripieri Junior, dono da operadora de de saúde Qualicorp; de Jonas Barcellos, da empresa de máquinas Brasif e conhecido como o “rei dos free-shops”; Marcelo Henrique Limirio Gonçalves, fundador da Neo Química e sócio da Hypermarcas. Além deles, de Walfrido Silvino dos Mares Guia Neto, ex-ministro do Turismo no governo Lula e conselheiro de Administração da empresa de educaçãoKroton.
Procurada, a Odebrecht informou que pagou as despesas das viagens do ex-presidente para Angola, Gana, Panamá, Peru, Portugal e República Dominicana. A empresa ainda disse que o ex-diretor de relações institucionais, Alexandrino Alencar, acompanhou Lula a todos esses destinos – e que o executivo “não participava de reuniões do ex-presidente, além daquelas estritamente relacionadas às palestras que o ex-presidente faria”. Além disso, a empresa confirma que fez doações ao Instituto Lula, mas não revela valores. A Camargo Corrêa, dona da Morro Vermelho Táxi-Aéreo, diz que patrocinou as palestras do ex-presidente Lula em Portugal, em setembro de 2011; em Moçambique e na África do Sul, em novembro de 2012; na Colômbia, em julho de 2013.
A Vale informou que Lula fez apenas uma viagem em aeronave da empresa. A Queiroz Galvão informa que contratou Lula para três palestras na América Latina e na África em 2011 e em 2013 como uma forma de patrocinar eventos promovidos por entidades de fomento ao desenvolvimento econômico e social. “Tais contratações se deram de forma legal e declarada aos órgãos competentes. Em nenhuma dessas situações houve utilização de aeronave de propriedade da empresa para transporte do palestrante”, diz a companhia. A Brasif afirmou que cedeu ocasionalmente a aeronave para Lula, sendo algumas vezes a convite da própria empresa. O empresário Josué Gomes afirmou que, em 2011, o assunto já “foi o objeto de reportagens”.
Sérgio Habib e Marcelo Henrique Limirio Gonçalves não responderam até o fechamento desta edição. Walfrido Silvino dos Mares Guia Neto, por meio de sua assessoria, disse que Lula realizou 14 viagens entre 2013 e 2015 em sua aeronave Cessna Citation CJ3. Já a OAS disse que não vai responder às perguntas feitas por ÉPOCA. Procurado, oInstituto Lula informou por meio de sua assessoria de imprensa que tem como política divulgar as viagens do ex-presidente ao exterior. “As viagens do ex-presidente Lula ao exterior não foram de turismo ou passeio. Foram dando palestras, falando bem do Brasil no exterior para investidores e autoridades estrangeiras, estimulando a participação de jovens na política e divulgando políticas sociais de combate à fome em eventos na África, América Latina, Estados Unidos, Europa e Ásia”, diz o Instituto Lula. “No caso de atividades profissionais, palestras promovidas por empresas nacionais ou estrangeiras, o ex-presidente é remunerado, como outros ex-presidentes que fazem palestras. O ex-presidente já fez palestras para empresas nacionais e estrangeiras dos mais diversos setores – tecnologia, financeiro, autopeças, consumo, comunicações – e de diversos países como Estados Unidos, México, Suécia, Coreia do Sul, Argentina, Espanha e Itália, entre outros. Como é de praxe, as entidades promotoras se responsabilizam pelos custos de deslocamento e hospedagem”, complementa. “A maioria das viagens do ex-presidente ao exterior não foram pagas pela Odebrecht, que contratou palestras para empresários e convidados em países onde a empresa já atua”, reitera. Além disso, o Instituto diz que todas as doações recebidas são contabilizadas e foram pagos todos os impostos correspondentes.
Conforme ÉPOCA revelou em maio, o Núcleo de Combate à Corrupção da Procuradoria da República no Distrito Federal iniciou umainvestigação para apurar se o ex-presidente praticou tráfico de influência internacional junto a chefes de Estado e autoridades em favor da Odebrecht, maior beneficiária dos financiamentos do BNDES no exterior. O MPF está analisando as relações entre o ex-presidente e a construtora baiana, sobretudo com o lobista Alexandrino Alencar. Lula está passando por uma turbulência sem fim.
Neste sábado, os leitores de VEJA saberão que a lama do Petrolão chegou ao 3° andar do Palácio do Planalto e invadiu o gabinete presidencial. A sequência de informações assombrosas contidas nareportagem de capa começa com a lista dos favorecidos com boladas desviadas da Petrobras pelo empreiteiro Ricardo Pessoa e a quantia que coube a cada um. O desfile dos recém-chegados ao acervo de alvos da Operação Lava-Jato é aberto por Lula e Dilma Rousseff. As revelações que se seguem são suficientemente devastadoras para reduzir a mera garoa a tempestade provocada pela prisão do manda-chuva da Odebrecht.
Engaiolado em Curitiba desde novembro, quando acumulava a presidência da construtora UTC e a coordenação do clube de empreiteiras formado para saquear a estatal, Ricardo Pessoa animou-se a contar o que sabia graças ao acordo de delação premiada longamente negociado com os procuradores federais que investigam a roubalheira colossal. Homologado pelo ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, o acerto resultou em cinco dias de depoimentos prestados em Brasília.
É improvável que outro participante do escândalo saiba tanto quanto Ricardo Pessoa. “As confissões deram origem a 40 anexos recheados de planilhas e documentos que registram o caminho do dinheiro sujo”, informa um trecho da reportagem de 12 páginas, dividida em 9 blocos, que expõe o que há de mais relevante no copioso material obtido por VEJA.
O mais recente lote de revelações impressiona pela fartura de detalhes e pelo cinismo do elenco. Os canastrões do faroeste à brasileira agiram com o desembaraço do bandidão depois do quinto uísque no saloon do vilarejo sem xerife. Já descobriram que ainda há homens da lei no Brasil. Vão ver o fim do filme numa cela de cadeia.
Era essa a palavra que, por pudor, vergonha, ou puro despiste, João Vaccari Neto usava para se referir ao dinheiro de propina com que a empreiteira UTC abastecia o caixa de seu partido
MOCH - Ricardo Pessoa contou que o tesoureiro do PT ia regularmente a seu escritório em São Paulo nos sábados para buscar dinheiro desviado dos cofres da Petrobras(VEJA.com/VEJA)
Homem do dinheiro, João Vaccari Neto é citado em diferentes trechos da delação de Ricardo Pessoa. O tesoureiro do PT aparece cobrando propina, recebendo propina, tratando sobre propina. O empreiteiro contou que conheceu Vaccari durante o primeiro governo Lula, mas foi só a partir de 2007 que a relação entre os dois se intensificou. Por orientação do então diretor de Serviços da Petrobras, Renato Duque, um dos presos da Operação Lava-Jato, Pessoa passou a tratar das questões financeiras da quadrilha diretamente com o tesoureiro. A simbiose entre corrupto e corruptor era perfeita, a ponto de o dono da UTC em suas declarações destacar o comportamento diligente do tesoureiro: "Bastava a empresa assinar um novo contrato com a Petrobras que o Vaccari aparecia para lembrar: 'Como fica o nosso entendimento político?'". A expressão "entendimento político", é óbvio, significava pagamento de propina no dialeto da quadrilha. Aliás, propina, não. Vaccari, ao que parece, não gostava dessa palavra.
Como eram dezenas de contratos e centenas as liberações de dinheiro, corrupto e corruptor se encontravam regularmente para os tais "entendimentos políticos". João Vaccari era conhecido pelos comparsas como Moch, uma referência à sua inseparável mochila preta. Ele se tornou um assíduo frequentador da sede da UTC em São Paulo. Segundo os registros da própria empreiteira, para não chamar atenção, o tesoureiro buscava "as comissões" na empresa sempre nos sábados pela manhã. Ele chegava com seu Santa Fé prata, pegava o elevador direto para a sala de Ricardo Pessoa, no 9º andar do prédio, falava amenidades por alguns minutos e depois partia para o que interessava. Para se proteger de microfones, rabiscava os valores e os porcentuais numa folha de papel e os mostrava ao interlocutor. O tesoureiro não gostava de mencionar a palavra propina, suborno, dinheiro ou algo que o valha. Por pudor, vergonha ou por mero despiste, ele buscava o "pixuleco". Assim, a reunião terminava com a mochila do tesoureiro cheia de "pixulecos" de 50 e 100 reais. Mas, antes de sair, um último cuidado, segundo narrou Ricardo Pessoa: "Vaccari picotava a anotação e distribuía os pedaços em lixos diferentes". Foi tudo filmado.
“Está tudo dominado”, continua a lamentar nas redes sociais a multidão de brasileiros que rejeitam tanto o governo lulopetista quanto qualquer vestígio de otimismo autorizado por fatos. Como demonstra o comentário de 1 minuto para a TVEJA, esse mantra é uma bobagem. Desde que foi escrito pela primeira vez por algum passageiro da desesperança, faz tanto sentido quanto os discursos de improviso de Dilma Rousseff.
Embora involuntariamente, quem acredita nessa miragem agride a verdade, insulta os que jamais admitiram a hipótese da capitulação, ofende os que não se renderam mesmo quando confrontados com adversários bem mais temíveis. Endossar tal fantasia é fechar os olhos às profundas mudanças na paisagem, visíveis a olho nu até por míopes com as pálpebras cerradas. Faltam poucas batalhas para o fim da guerra. A vitória nunca esteve tão próxima, mas continua de bom tamanho a legião dos democratas que teimam em ver um exército poderosíssimo onde só há patrulhas em andrajos.
Se tudo estivesse dominado, nenhum mensaleiro teria descoberto como é a vida numa cadeia. Se tudo estivesse dominado, não haveria uma Operação Lava-Jato, e a bandidagem envolvida no Petrolão já teria silenciado o juiz Sérgio Moro, os procuradores federais, a Polícia Federal e os jornalistas que insistem em contar o que está acontecendo. Se tudo estivesse dominado, esta coluna não existiria. Se tudo estivesse dominado, as portentosas manifestações de rua promovidas por milhões de indignados ainda seriam apenas um brilho no olhar dos resistentes.
Há um ano, ninguém conseguiria imaginar um grande empreiteiro na cadeia. Hoje, os ricaços pilhados com a mão no cofre da Petrobras são vizinhos de cela ou de beliche em Curitiba. Em novembro passado, eufórico com a reeleição do poste que instalou no Planalto, Lula já se via com a faixa presidencial enfeitando o peito em janeiro de 2019, pronto para mais quatro anos de tapeação. Neste fim de semana, o gabola compulsivo obrigou-se a confessar que luta pelo adiamento da morte política chapinhando no volume morto.
Sim, o PT e seus comparsas continuam infiltrados em todas as ramificações da máquina administrativa federal. Sim, é perigoso subestimar o maior de todos os clubes dos cafajestes. Também é verdade que tumores liberticidas infestam o organismo democrático. Mas o partido que reivindicava o monopólio da ética transformou-se num bando desprezível, numa patética caricatura da sigla em sua infância. Devastado pela vigarice e pelo cinismo, o PT virou uma abjeção controlada por delinquentes disfarçados de guerreiros do povo brasileiro.
Os resultados de todas as pesquisas berram em coro: o governo Dilma agoniza e os devotos da seita que têm em Lula seu único deus são uma espécie em extinção. O desempenho da presidente da República é considerado lastimável por 7 a cada 10 eleitores. Só Fernando Collor chegou perto disso. O chefão que posava de reizinho das urnas se vai reduzindo a candidato nanico. Na mais recente pesquisa Datafolha, o índice que conseguiu seria alcançado por qualquer Sibá Machado repaginado por algum marqueteiro malandro.
O agravamento da crise econômica que mal começou se somará ao que vem por aí a bordo da Operação Lava-Jato para reduzir a quase nada as chances de sobrevivência do ajuntamento em estado terminal. Restarão milhares de fanáticos, claro, mas enfim submetidos aos mandamentos das democracias modernas. Eles consumiram mais de 12 anos tentando mandar em tudo. Falta pouco para que estejam todos dominados.